Equilibrando o Individual e o Coletivo

O ano de 1776 presenteou o liberalismo com fatos que transformariam o mundo como, por exemplo, a independência das 13 Colônias Americanas, além da obra prima de Adam Smith, escocês considerado o pai da economia moderna que, em determinado momento da sua Riqueza das Nações esclarece: Não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro e do padeiro que esperamos o nosso jantar, mas da consideração que eles têm pelos próprios interesses. Apelamos não à humanidade, mas ao amor-próprio, e nunca falamos de nossas necessidades, mas das vantagens que eles podem obter.

Baseados nesta afirmação concluímos que, além de reconhecermos que o amor-próprio é fato gerador da prosperidade pessoal apoiado na individualidade, assume-se, na outra face da mesma moeda, a importância da convivência social, das interações pessoais e consequente criação de vínculos, os quais serão fundamentais ao desenvolvimento social coletivo.

Cada uma das profissões ali listadas individualmente, depende, direta ou indiretamente da outra, coletivamente, para que possam se desenvolver melhor e continuamente, criando uma atmosfera social mais saudável para todos. Ou seja, cada um fazendo o seu trabalho, tanto para o seu próprio desenvolvimento, quanto para buscar o bem comum e a superação coletiva das dificuldades corriqueiras que a vida apresenta.

No caso do individualismo ultrapassar as fronteiras do aceitável, tende a acontecer um baixo – ou até mesmo nenhum – desenvolvimento social coletivo, correndo-se o risco, ainda, da errônea personificação de uma eventual e equivocada figura do salvador da pátria, como acontece no Brasil, infelizmente, desde os tempos de colônia. Deixa-se de pensar no coletivo, para apostar todas as fichas naquele individuo, criando bases menos sólidas ao desenvolvimento social coletivo e fortalecendo o individualismo alheio, criando com isso relações sociais e laços coletivos cada vez menos intensos.

Cada um de nós deve desenvolver suas habilidades, tanto para que consigamos alcançar nossos objetivos pessoais, mas também tendo em mente que tais habilidades deverão também servir a nossa comunidade, visando a construção contínua de uma sociedade cada vez mais evoluída, saudável e, consequentemente, livre. Ao contrário, quando a sociedade evita, por qualquer motivo, que o indivíduo se desenvolva pessoalmente, acaba se autocondenando à mediocridade.

As desigualdades sociais existem em qualquer lugar do mundo, infelizmente, mas doem mais quando são experimentadas no nosso próprio quintal e quando se percebe que tais desigualdades criam barreiras, por vezes intransponíveis, para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa, saudável e livre. E uma boa parcela dessas desigualdades pode ser creditada ao individualismo acentuado ao extremo, que não busca objetivos harmoniosos e compatíveis com a coletividade. O corporativismo, tão presente na cultura brasileira, é um exemplo intrínseco disso. Aqui, a defesa de grupos ao invés da coletividade, é marca registrada contínua e amplia desigualdades sociais, já gigantescas em nossa sociedade. Nesse conflito diário, cada indivíduo luta por adquirir mais vantagens e privilégios (invocando a malfadada Lei de Gerson), criando estruturas exclusivas e excludentes.

As desigualdades criam muralhas que impedem o desenvolvimento social com consequências desastrosas para todos, seja individual ou coletivamente. Os direitos e liberdades individuais são fundamentais e indiscutíveis, porém, não podem perder de vista os coletivos e, para diminuir tais desigualdades, criamos mecanismos de desenvolvimento voltados tanto para o indivíduo quanto para a coletividade, criando uma sociedade melhor e mais consciente individualmente. É tarefa de cada um de nós lutar por mais liberdade, sem esquecer de nossa responsabilidade sobre o todo.

Foto: Davide Ragusa